CONDE AFONSO CELSO

PATRONO DA CADEIRA NÚMERO 40

Por Joaquim Cabral Netto

Filho do Visconde de Ouro Preto e de D. Francisca de Paula Martins de Toledo, Francisco Celso de Assis Figueiredo Júnior, o Conde Afonso Celso, nasceu em Ouro Preto, Minas Gerais, em 21 de março de 1860. Quase no ocaso do II Império, na última década daquele regime, foi por quatro vezes reeleito Deputado Imperial pelo 20º Distrito da Província de Minas Gerais.

 
Com a Proclamação da República seu pai foi alcançado pelo banimento, e isso foi a pá-de-cal que o levou ao desgosto da vida pública e a pautar suas
atitudes em absoluta solidariedade com seu pai pelo resto da vida. Seu amor
filial era um dos traços predominantes do seu caráter.

 
Na sua vertente de jornalismo colaborou na República, órgão do Clube Republicano Acadêmico, 1877/1878; no Santa Cruz, 1902/1903; no Diário do Comércio, todos de São Paulo; na Gazeta, de Sorocaba: na Tribuna Liberal, 1888/89; no Brasil, 1892; no Liberdade, 1896/1897; no Correio da Manhã, 1902 e na Gazeta de Notícias, 1902, todos do Rio de Janeiro. O jornal, todavia, no qual emprestou sua colaboração por mais tempo, foi o Jornal do Brasil onde, desde 1906, criara a seção “Cotas ao Acaso”, publicada sem interrupção no correr de vários anos.

 
A poesia foi um ponto alto na vida de Afonso Celso. Entre os trabalhos que publicou, em prosa e verso, podemos elencar: Prelúdios, (1875); Devaneios, (1877) e Telas Sonantes (1879). Àquelas obras seguiram-se Poemetos (contendo Afronta, Filho da Selvas e Um herói) (1880); Poesias Escolhidas (1898); Rimas de Outrora (1899); Trovas de Espanha (traduções, 1899); Mês do Rosário (poesia religiosa).

 
Publicou os Dramas, Um ponto de interrogação (1879) e Giovanina (1897); os Romances Lupe (1894), Um Invejado (1900) e a Tradução de Um capricho do Dr. Ox.

 
Na gama extraordinária de sua produção intelectual ainda vamos encontrar:
Exposições industriais (1876); Um ponto de interrogação (1879); Camões (1880); Teses e dissertações sustentadas a fim de obter o grau de doutor (1881); Orçamento do Ministério dos Estrangeiros (1882); La question de l’esclavage au Brésil (1886); Aventuras de Manoel João (1889); Vultos e Fatos (1892); O Imperador no exílio (1893); Minha Filha (1893); Notas e Funções (1894); Guerrilhas (1895); Contraditas Monárquicas (1896); José Vieira Couto de Magalhães (1898); Aventuras de Manoel João (1899).

 
O rol de sua produção literária parece sem fim: O Dr. Moitinho (comédia): O gorro de papai (comédia infantil); Defesa perante o Conselho de Guerra a que foi sujeito por crime de deserção o 1º Tenente Dr. Augusto Pereira da Silva Lima (1895); Aos Monarquistas (1895); Tese do congresso de História Nacional (1914); Uma grande lição em poucas palavras (1915); Pulverizando calúnias (1916); Biografia do General Couto de Magalhães; A reforma do ensino superior e a Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro (1916), Segredo conjugal (1932).

 
Na Revista do Instituto Histórico, entre grande número de discursos de recepção e de saudação, publicou: Bicentenário de Ouro Preto, Os Jesuítas, Conferências Populares.

 
Porque me ufano de meu país (1901), dedicado a seus filhos por ocasião dos festejos do 1º centenário de nossa independência, é um de seus trabalhos mais difundidos e foi traduzido para o francês, o italiano e o alemão. Um verdadeiro hino de louvor e admiração ao Brasil, “breviário do civismo”, como lhe chamou Ildefonso Falcão 1, esse pequeno livro, que é uma jóia da literatura brasileira, di-lo Teixeira de Freitas, foi um dos instrumentos mais poderosos para a criação do sentimento de brasilidade”2. O último livro publicado pelo Conde Afonso Celso foi a Biografia do Visconde de Ouro Preto, uma volumosa obra onde recolheu os artigos que, através da vida, trataram da vida de seu pai.

 
O Conde Afonso Celso foi membro e presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, construiu-lhe nova sede, e durante sua gestão apareceram quarenta e três volumes da Revista do Instituto, bem como a publicação dos dois primeiros volumes do Grande Dicionário do Instituto.

Católico fervoroso e exemplar, foi a robustez de sua fé religiosa, disse Alfredo Valadão, que lhe deu forças para suportar, impávido e resignado, umas após outras, as mais duras provações!3 Em 1905, em agradecimento pelos seus serviços excepcionais à Igreja e louvor pela sua vida exemplar de católico, o Papa Pio X conferiu-lhe o título de Conde Romano, que o Papa Bento XV tornou perpétuo e hereditário.

 
Na Academia Brasileira de Letras, da qual era fundador, exerceu, em diferentes momentos cargos de diretoria, tendo sido seu Presidente em 1925 e em 1935.

 
Poucos hoje têm conhecimento de um artigo de Afonso Celso, escrito em março de 1922, no Jornal do Brasil, sugerindo o nome de Brasília para a futura Capital do Brasil. Disse ele, naquela oportunidade:
Nem Hipólito Pereira, nem José Bonifácio, nem Varnhagen, nem o decreto de 18 de janeiro, ninguém cogitou ainda do nome que deve ser dado à nova Capital. Parece-nos que Brasília será acertado. Denominado Brasília a nova Capital da União indicar-se-á que ela será realmente relacionada com o Brasil inteiro, a expressão, o epítome genérico da pátria brasileira.

 
Em 1958, quando da posse da diretoria da Sociedade dos Amigos de Afonso Celso, registrou Juscelino Kubistcheck de Oliveira:
Afonso Celso, professor e poeta foi, no quarto centenário do Descobrimento do Brasil, esse guia, esse visionário, esse oráculo. Transcorrido tanto tempo, a sua palavra nos chega com a pureza das virtudes que a inspiraram: e a sua crença na Pátria se clarifica e se atualiza, como o sentimento da honra presente!

 
Quando se debruça sobre o perpassar da vida de Afonso Celso tem-se um encontro com a firmeza da personalidade de um homem. Dele, disse Assis Chateaubriand:
Afonso Celso permaneceu no posto de paladino da causa monárquica durante 48 anos, sem um minuto de hesitação ou de abandono de suas ideias favoritas.
Nabuco, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Rosa e Silva, Silveira Martins, todos sentaram praça no serviço da República. Ele ficou fiel ao regime decaído e o seu exemplo é de uma coerência inimitável..., renunciou
à sua carreira de homem público, afim de guardar fidelidade a um rei morto e a uma família banida.4

 
Tristão de Athayde foi preciso ao lhe traçar o perfil:
Ele foi para nós um dos mais belos representantes do que há de sempre jovem na fidelidade às intangíveis tradições da nossa civilização brasileira e cristã.
Seu nacionalismo nunca foi integral, nem agressivo, nem jacobino. Seu tradicionalismo nunca foi fóssil, anacrônico ou estático. Sua fé, nunca foi fanática, estreita, amesquinhada. Sua velhice nunca
foi cortesã de ideias exóticas. Sua vida foi sempre o espelho de nossa mais autêntica civilidade”.5

Com todo fulgor de sua cultura, e a gama de suas atividades, foi um homem que lutou pela vida, com dignidade, com desprendimento e com sofrimentos. “Ele sabia que na República poderia aspirar a todos os postos, ... e de tudo ele abriu mão...”6 Poderia ter tudo, e morreu sem nada! “Vivendo na pobreza, disse Joaquim Thomaz, pobreza aureolada pelo trabalho infatigável, Afonso Celso morreu como viveu: pobre! As posições que ocupou não lhe deram para amealhar”. 7

 
No mesmo dia em que a edição do Jornal do Brasil anunciava a sua morte, saiu o último dos artigos que tinha preparado para aquele jornal. Morreu, assim, trabalhando!

 
Foi um republicano na Monarquia, e um monarquista na República. “Com ele desapareceu o último dos grandes homens públicos que o Império formou e uma das mais ricas reservas morais e cívicas do Brasil de todos os tempos”. 8

 
Com ele se foi o último sobrevivente da última Câmara da Monarquia, o último deputado que votara a abolição da escravatura. Com ele se foi o último fidalgo da nossa história!
 


 

1. Discurso de honra na Sociedade dos Amigos de Afonso Celso, 1958.

2. In pronunciamento no Conselho Nacional de Estatística. Conf. Jornal do Brasil de 17.07.1938.

3. Manifestação na Sessão Especial do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, in Revista do Instituto, n.233, p. 19.

4. In O Jornal, 16 de julho de 1938.

5. In O Jornal, 13 de julho de 1938.

6. Barbosa Lima Sobrinho, in Jornal do Comércio.

7. In Jornal do Brasil, 13 de julho de 1938.

8.  “Um homem da Monarquia”, Nelson de Souza Carneiro, in Jornal do Brasil, de 13 de julho de 1938.