D. PEDRO II

PATRONO DA CADEIRA NÚMERO 65

Por Gilberto Madeira Peixoto

D. Pedro II, soberano digno e impoluto cujo lema: “trabalhar pelas letras e pela ciência é lutar pela Pátria e pela humanidade”, enche-nos de alegria e orgulho. Filho de D. Pedro I, da Casa Real Portuguesa de Bragança e D. Maria Leopoldina de Habsburgo, arquiduquesa da Áustria, tinha seu nome extenso, como os grandes monarcas: Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano
Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga.

Nascido no Palácio de São Cristóvão, em 2 de dezembro de 1825, quando a corte do Rio de Janeiro acordou com as salvas em fortalezas e navios: “três tiros de foguete anunciaram a chegada do pequeno príncipe, o primeiro a nascer em território nacional”.

Ao completar seu primeiro ano, encontrava-se enferma sua mãe, que sucumbiu ao parto prematuro de seu sétimo filho em 12 de dezembro de 1826, o que contribuiu para a construção popular da imagem do “mártir da nação”: o príncipe estava órfão de sua mãe.

Seus primeiros estudos foram sob a orientação direta da camareira mor. D. Mariana Carlota de Werna Magalhães Coutinho (Condessa de Belmonte), a quem D. Pedro II carinhosamente a chamava de Dadama, e de Frei Antônio de Arrábida.

Torna-se Imperador com a abdicação de D. Pedro I, em 7 de abril de 1831, e sob a tutela de José Bonifácio de Andrada e Silva, que passaria a dirigir pessoalmente a Formação desse imperador menino, mas por pouco tempo, pois com a queda de Bonifácio, exilado em Paquetá, assume a tutela, Manoel Inácio de Andrade Souto Maior (Marquês de Itanhaem), que preferiu confiar o encargo a Frei Pedro de Santa Mariana e Sousa; porém, antes de nove anos de idade a orfandade se completa com a morte do pai em setembro de 1834.

Acelera-se o processo de produção pictórica sobre o futuro monarca, e sua imagem começa a ser veiculada dentro e fora do país, cercado de símbolos do poder, entretanto sempre com aquele traço delineado que o acompanharia em sua trajetória de vida: a dissimulação, traduzida pelo olhar de esguelha, a expressão impassível e serena, marcas de sua própria personalidade, que Radiguet denominou “rosto marcado pelo caráter” (plein de caractère).
Homenzinho aos nove anos, entre as lições de latim e história sagrada de Frei Pedro de Santa Mariana, as de literatura do Marquês de Sapucaí, as de caligrafia de monsieur Boulanger, as de alemão do doutor Shuch, as de francês de monsieur Boiret, as de geografia e história de monsieur Taunay e as de inglês de mister Lucas.

“Uma meninice sem gosto nenhum de meninice”, príncipe sem ser “pequeno príncipe”, preparado para governar, menino sem infância e sem brinquedos, ficou sem as estórias de reinos encantados, porque seu reino era uma herança de responsabilidade.

Brincar, a melhor de todas as liberdades, não a conheceu o Imperador que não pode brincar de carrossel nas almanjarras, nem empinar papagaio ou jogar pião, nem mesmo ouvir histórias da carochinha, da mãe d’água ou de sacis; apenas fábulas de La Fontaine, ou coisas compatíveis com a sua idade, tendendo sempre e progressivamente ao aprofundamento dos diversos assuntos.

Em 1839, o sabarense Cândido José de Araújo Viana, Visconde e mais tarde Marquês de Sapucaí quando lecionava para D. Pedro II, exerceu grande influência sobre a atitude do jovem monarca no processo decisório da maioridade, a tal ponto que indagado pela delegação parlamentar se desejava assumir logo o poder, D. Pedro foi categórico: “QUERO JÁ”.

Aos 23 de julho de 1840, numa vitória do partido liberal e com a valiosa participação de Antônio Carlos de Andrada, tendo sido decretada sua maioridade, prudentemente D. Pedro II não aceitou o encargo de assumir logo, pois ainda não havia completado os 15 anos.

Coroado em 1841, aguardava-se a cristalização do momento de se casar para que sua imagem de adulto se completasse; mas, tímido, corava-se ante a idéia do casamento, entretanto as tratativas seriam feitas à moda das cortes européias, sem a sua participação. Encontrada a noiva, Princesa Teresa Cristina Maria das duas Sicílias, dos Bourbon e Habsburgo, da linhagem do Imperador, realiza-se o casamento por procuração, em 30 de maio de 1843 na Capela Real Palatina de Nápoles; chegando a Princesa ao Rio de Janeiro a 3 de setembro de 1843, e deste casamento tiveram quatro filhos, D. Afonso, Dona Isabel, Dona Leopoldina e D. Pedro Afonso.

Desde criança o Imperador praticava ações caritativas aos sábados, dividindo pessoalmente seu ordenado com os pobres nas galerias do Paço de São Cristóvão, jamais tendo designado alguém para tal ato de bondade em seu nome: “entre tantos pobres, habituou-se D. Pedro II a considerar-se quase um deles” (Pedro Calmon). Imperador pobre, nunca ostentou outros valores que não aqueles de sua exemplar simplicidade, moldura de quem é rico de alma.

Consolidou a soberania nacional, impulsionou o progresso e trouxe ao país o telégrafo, o cabo submarino, o telefone e o selo postal; defendeu a ecologia, construindo a floresta da Tijuca e o jardim botânico de Manaus. Criticado por alguns jornalistas e cronistas, foi por outros elogiado, inclusive alguns estrangeiros que aqui estiveram (Gobineau, Agassiz, Radiguet). Machado de Assis em outubro de 1877, elogia o Imperador através de suas crônicas, denominando-o: “esclarecido e honesto” dizendo: “sua majestade é um homem probo, lhano, instruído, patriota que soube fazer do sólio uma poltrona, sem diminuir a grandeza e a consideração”.

Nos últimos tempos do reinado de D. Pedro II, tomava corpo o movimento republicano, e apesar de defensor da liberdade de imprensa, esta o destacava como um cidadão doente, maluco ou decrépito. Na verdade, nos anos de 1887/1888 o Imperador enfermo, mas não louco, fora a Europa para tratamento, quando sua filha Isabel assinou a Lei Áurea em 13 de maio de 1888, desagradando escravagistas (que apressaram a queda da monarquia).

Em 15 de novembro de 1889, dá-se a proclamação da república, cai a monarquia e D. Pedro II é “convidado” a retirar se do país em 24 horas. É bem escuro o cinzento da noite histórica: iluminando sinistramente a solidão, perfilavam-se os postes melancólicos dos lampiões de gás, quando aparecia o préstito dos exilados; “nada mais triste que um coche negro puxado a passo por dois cavalos, que se adiantavam de cabeça baixa, como se dormissem andando” (Raul Pompéia). Quase na extremidade do molhe, o carro parou e o senhor D. Pedro de Alcântara apeou-se; um vulto indistinto entre outros vultos, a pisar pela última vez a solo pátrio. Declinou da pensão de 5000 contos de réis que lhe oferecia o Governo Provisório para radicar-se no estrangeiro, o que causou descontentamento entre os republicanos. Partiram para Europa, pois “Reis não são expulsos...saem”. O navio Alagoas chegava a Portugal nos primeiros dias de dezembro de 1889 e em 28 do mesmo mês, triste e com muito sofrimento, falece a Imperatriz D. Teresa Cristina Maria de Bourbon em um modesto hotel do Porto.

Como D. Pedro não possuía dinheiro para o translado do féretro, pois havia dividido com os pobres da cidade do Porto seus últimos 160 mil réis que lhe sobravam nos bolsos, o Visconde Álvares Machado, rico português e amigo, ofereceu-lhe o quanto precisasse. A cena retratada pelo Visconde fora dramática: encontrando D. Pedro II sozinho no quarto do hotel, onde jazia em uma cama pobre o corpo de D. Teresa Cristina, ele sentado em uma cadeira, chorava em silêncio como se não quisesse molestar o sono eterno da Imperatriz. As próprias lágrimas percorriam-lhe carinhosamente a face marcada pelas angústias que os percalços da vida proporcionaram a quem, não fosse Imperador, teria sido professor, conforme revelara a Pimenta Bueno (Marquês de São Vicente).

Dois anos após, em 5 de dezembro de 1891, morria o Imperador, pobre e solitário, no hotel Bedford em Paris, quando os jornais destacaram: homem culto e patriota, gentil e indulgente, tinha todas as virtudes privadas e públicas e mesmo assim morreu no exílio.

Todos os jornais da Europa noticiaram a morte do monarca, (Le Roi est mort, vive Le Roi) com os destaques de grande Imperador.

O cortejo fúnebre comoveu o mundo numa derradeira cena teatral em que a própria república se calou diante da força e do impacto das manifestações.

Os Corpos do Imperador do Brasil e de sua esposa, depositados no Panteão dos Braganças, em Lisboa, foram transladados para o Brasil em 1922, onde repousam em Petrópolis na Catedral cuja construção teve início sob seu generoso patrocínio.

Mais se assemelhou a um poeta ou sábio que mesmo um Imperador, mas se oportunidade tivesse sido dada a ele concretizar seus vários projetos, sem dúvida teria feito do Brasil um dos países mais ricos do mundo. Passou à história como um governante e incentivador das artes e da cultura, da instrução pública e do progresso.