INCONFIDENTE JOSÉ ÁLVARES MACIEL

PATRONO DA CADEIRA NÚMERO 77

Diploma de graduação de José Álvares Maciel na Universidade de Coimbra - 16/07/1785

 

Por Christobaldo Motta de Almeida


Álvares Maciel nasceu em 1760, em Vila Rica, sede da capitania. Era filho do Capitão Mor José Álvares Maciel, seu homônimo, e de Juliana Francisca de Oliveira. Apesar dos bens e do prestígio que possuía, seu pai tornou-se grande devedor da Fazenda Real devido ao insucesso nos negócios. Contudo, mandou seu filho José estudar na Europa, como já havia feito com os outros.

Dirigiu-se, inicialmente, para Coimbra, em l782 onde concluiu o curso de Filosofia Natural, aos 25 anos, tendo sido aprovado, por unanimidade. O seu diploma está no Museu da inconfidência, em Ouro Preto. Estudou Aritmética, Filosofia Racional e Moral, História Natural (Botânica, Zoologia e Mineralogia), Geometria, Física Experimental e Química. Era um curso equivalente ao de Engenheiro de Minas e Metalurgia. Domingos Vandelli, seu mestre, impressionado com o aluno excepcional o convidou a realizar pesquisas mineralógicas em Portugal, citando-o como classificador de várias rochas e descobridor de jazidas de arsênio em Serra da Estrela. Em 1784, seu nome aparece no Jornal Gazeta, de Lisboa, entre vários estudantes que fizeram experiências aerostáticas com balões.

Formado, viajou pela Europa, custeado por seu pai, tendo ficado na Inglaterra, por um ano e meio, onde aperfeiçoou seu conhecimento de química e sua prática em vários ramos da indústria manufatureira. Observava o funcionamento das indústrias têxteis e os fornos de Birmingham. Enquanto lá permanecia, Minas, pagava além dos quintos, vários impostos que sufocavam a todos os que constituíam a economia local, tornando intolerável a situação vigente.

De volta ao Brasil, em junho de 1788, trouxe na sua bagagem uma perigosa prova da conjuração: a coleção de livros sobre a América Inglesa (Estados Unidos), dentre as quais Recueil dês Loys Constitutives des États-Unis de l’Amerique Septentrionale. Na cabeça, ideias que foram catalisadas ao longo de sua viagem, adquiridas no convívio com outros estudantes e luminares da época. Comprovadamente os ideais de Álvares Maciel foram reforçados nos ambientes maçônicos frequentados na Europa; e as ideias que abraçou lá, vieram com ele, disposto a lutar para que fossem aqui aplicadas.
Recém-chegado ao Rio, em agosto de 1788, é procurado por Tiradentes, que ali se encontrava em gozo de licença. Álvares Maciel discorreu sobre as invencíveis ideias de liberdade que empolgavam a Europa e sobre o reflexo delas no Brasil, o que levaria à independência nacional. Tiradentes vivamente interessado, sentindo as aspirações do jovem Maciel, expôs a situação da Capitania com a eloquência da sua fala, mostrando, em detalhes, o quanto era vexatória a situação do povo. Ambos concordaram acerca da oportunidade de ser levada a efeito uma revolta, um movimento armado capaz de sacudir o jugo opressor que sufocava o Brasil, e de extinguir, assim, o domínio de Portugal. Isso se tornou idéia fixa para Tiradentes.

Esse encontro deu a Tiradentes maior entusiasmo na execução do movimento libertário. Álvares Maciel presenteou Tiradentes com um livro contendo os fundamentos da jovem república americana e a história de sua autonomia. Esse livro, venerado pelo Alferes, impresso em francês, era lido com dificuldade por Tiradentes, ao clarão dos candeeiros, varando horas longas das madrugadas gélidas de Vila Rica. Nele, fazia anotações sobre as leis e penas a serem humanizadas.

Após estada de pouco mais de um mês no Rio, voltou a Vila Rica em outubro de 1788, acompanhando o Visconde de Barbacena, Governador da capitania e amigo, quem o convidou a morar no Palácio do Governo para que fosse preceptor dos seus filhos e um dos seus colaboradores. Em Vila Rica, num diálogo entre Alvarenga Peixoto e Francisco de Paula, este é interrompido por Álvares Maciel, quem então fornece explicações sobre o apoio ou os socorros que as Cortes estrangeiras poderiam dar ao Movimento. Maciel, recém-vindo da Europa, convence com sua explanação o cético Alvarenga da possibilidade de sucesso da sublevação e faz prosélito seu cunhado.

Noutra ocasião, o Governador, amigo de Maciel, hospedou-o em sua casa e, por duas vezes, ao entrar no quarto do hóspede, surpreendeu-o mergulhado na leitura das leis americanas. Não havendo meios de comunicação de massa, e ausentes os comícios, apenas através da conversa ao pé do ouvido era possível conhecer as ideias inovadoras. Os livros além de raros alcançavam somente a elite.

Com a conspiração em estágio avançado, prometeu fazer a pólvora e montar indústrias siderúrgicas e têxteis, e opinou sobre a estratégia para tomar os cofres da Fazenda Real, como medida inicial. Exerceu sua profissão durante um ano em Minas, porque foi apanhado pelas malhas da devassa, sendo preso e levado para o Rio.

Nesse curto período fez pesquisas minerais em Sabará, Caeté e em torno de Vila Rica, recebendo, para tanto, material de pesquisa e dinheiro da Junta Real. Relatou ter descoberto vitríolo de cobre nas fraldas da Saramenha, no Distrito da Freguesia de Antônio Dias. Encontrou, ainda no mesmo sítio, uma argila micácia, semelhante à mica, de cor verde, que, submetida ao fogo, perdia a cor e se liquefazia como vidro. Também no Morro das Lages, observou abundância de arsênico, ouro e ferro. Na Mina do Contijo, verificou a presença de enxofre. Constatou a presença de cobre puro na região que vai de Cachoeira do Campo a São João do Morro Vermelho. Essas explorações foram suficientes para provar seus conhecimentos.

Em 13 de agosto, foi ouvido, na qualidade de testemunha n°23, pelo Juiz Torres e pelo escrivão Cleto, da Devassa-RJ, que se encontravam em diligência, em Vila Rica. Depois de preso, voltou a ser ouvido na Devassa-MG em Vila Rica, na 1ª Inquisição, repetindo o que já havia informado. Na 2ª Inquisição, no dia seguinte, com novas informações, o Juiz aprofundou-se no conhecimento da posição de Álvares Maciel, em Face da Inconfidência.

Em outubro de 1789 é encaminhado a Fortaleza de Nossas Senhora da Conceição de Villegagnon, no Rio, ali permanecendo incomunicável por quase dois anos entre um depoimento e outro. Segundo o Frei Raimundo de Penna Forte, que o assistiu na sala do Oratório da cadeia do Rio de Janeiro, Álvares Maciel “era homem de belas qualidades de caráter e de rara instrução”.

Condenado à morte na forca, na véspera da execução teve sua pena comutada em degredo perpétuo, em Massangano, Angola, na África, por ato de D. Maria I. Algumas obras técnicas e científicas ele levou na viagem; outras, que podiam ter conotação política, aqui permaneceram porque serviriam como provas da conspiração. Foi internado, por quatro dias, com pneumonia e escorbuto, na enfermaria da Fortaleza de São Francisco de Penedo, depois, seguiu a viagem para o Presídio de Massangano, subindo o rio Congo, em canoa. Aí, entretanto, não ficou preso, pois a pena era de degredo.

Começou a lutar pela sobrevivência, tornou-se representante comercial na área de Calumbo, onde visitou as ruínas de uma fábrica de ferro, em Oeiras. Recebeu do Governador, o encargo de verificar a existência de riquezas minerais nas regiões percorridas. Essa missão deu-lhe novo ânimo, levando-o a montar uma pequena siderúrgica, no sítio de Cathari, onde produziu ferro.

Escreveu ao Governador solicitando mão-de-obra especializada e sugeriu que fossem trazidos do Brasil, carpinteiros, ferreiros e oficiais mecânicos. Recebeu elogios do Rei de Portugal em carta dirigida ao Governador, quem, ao lê-la, na sua presença, causou-lhe lágrimas nos olhos. Realizou-se, assim, na profissão, como mineralogista, químico e metalúrgico.

Possuía um espírito curioso, dedicado à ciência, às pesquisas, inteligente, humanista, com senso forte de liberdade, voltado para o desenvolvimento da sua terra, patriota, inconformado com o colonialismo e empenhado em vencer na luta pela vida.

Consagrou-se como herói na gloriosa luta pela liberdade do Brasil. Faleceu, aos 43 anos. Foi sepultado na igreja de Massangano, e exumado em 1936. Suas cinzas, trazidas em urna para o Brasil, foram depositadas no Panteão dos Heróis, no Museu da Inconfidência.