HENRIQUE GUILHERME FERNANDO HALFELD

PATRONO DA CADEIRA NÚMERO 83

Por Lívia Paulini


O engenheiro Henrique Guilherme Fernando Halfeld, fundador da cidade de Juiz de Fora, foi pioneiro em todos os sentidos da palavra. Nasceu em 1797 e morreu em 1873. Do seu berço em Klausthal Zellerfeld na Alemanha, até seu ataúde no Rio de Janeiro, percorreu épocas e terras longínquas, que podem ser medidas em termos contraditórios por causa da sua herança familiar e da sua adaptação à terra mineira.

No seu destino encontrei uma coincidência singular com o seu conceito de pioneirismo que poderia ser resumida no essencial nas seguintes afirmações:“Em vez de comparar os monumentos históricos da Velha Europa com a exuberância paradisíaca da Terra Nova que seria absurda seguiremos simultaneamente a evolução das duas culturas, ambas numa visão universal. Assim poderíamos compreender as duas Terras e suas gentes, onde as sucessivas obras erguidas formam um conjunto harmônico”.

Filho do casal alemão Carlos Augusto Theophilo Halfeld e Dorothea Antonieta Elster, Henrique Guilherme formou-se em Engenharia n aAcademia de Minas de Klausthal, na época da famosa batalha de Waterloo (1815).Ferido na guerra ficou desiludido com a política da Europa Ocidental. O fundador de Juiz de Fora nasceu e cresceu num ambiente turbulento, no princípio do século XIX, onde do Mar Mediterrâneo até o Mar Nórdico, dezenas de territórios soberanos (reinados, principados, ducados e cidades livres), como um gigante caleidoscópio representavam a Europa Ocidental. Henrique Guilherme descobriu essa situação absurda quando em seis anos, alternadamente, ora os franceses (1803-1806), ora os prussianos (1801-1805) ocuparam a sua terra natal (Hanover era reinado de 1814 a 1866 e Província da Prússia de 1866 a 1945).

O exército francês, sob o comando de Napoleão, dominava a maior parte da Europa. Talheres e pratos dourados caracterizavam a corte napoleônica, pois Bonaparte era obcecado pela história pessoal de César Augusto e imitava o imperador romano, mesmo na sua autopromoção de Cônsul para Imperador (1804).

As obras de arte e a opulência da nova nobreza da França contrastavam com os costumes moderados e puritanos dos habitantes de territórios e cidades livres da Alemanha.O espírito da revolução francesa não foi exportado e a estrutura feudal da Itália e da Alemanha foi mantida. Ambiguidade e ignorância tomaram o lugar dos tradicionais eventos culturais. O verdadeiro significado das mudanças sócio-políticas era suspeito. Particularmente cada indivíduo estabelecia o seu próprio limite de compreensão e, mais ainda, foram tomadas atitudes não documentadas para evitar conflitos com as autoridades reinantes.

Tendo em vista as constantes guerras locais, Henrique Halfeld, já casado com Dorothea Augusta Filippina, deixou sua pátria e migrou para o Brasil, em 1825. Pouco antes de ancorar, ainda a bordo do navio DORIS, nasceu Pedro, seu filho primogênito. A emoção da chegada do filho e a vista da beleza da terra nova, marcaram indelevelmente o acontecimento.

Como engenheiro começou a trabalhar nas companhias de mineração de São João Del Rey e Gongo Soco expandindo o modelo inglês com a prática alemã e em seguida, transferindo a tecnologia para a Serra dos Cocais. Naturalizou-se brasileiro, por decreto assinado pelo Regente Pedro de Araújo Lima, no dia 29 de agosto de 1839.

O acadêmico Wilson Lima Bastos dedicou uma obra ímpar à Família Halfeld. O livro foi lançado no centésimo e quinquagésimo aniversário do seu desembarque no Rio de Janeiro e onde foi transcrito o discurso do Visconde de Porto Alegre por ocasião da Sessão Magna do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil no ano de 1858, elogiando o engenheiro Halfeld:

“...Devo, por um legítimo entusiasmo, dizer-vos duas palavras acerca de um trabalho monumental, devido ao zelo e singular perícia do nosso estimável colega Sr. Halfeld: é a exploração do Rio São Francisco desde sua foz até às vertentes, ...” e mais adiante: “...sei de longos anos que o compasso, o lápis, a pena e o pincel não vão de par com a velocidade do pensamento em obras tais e com resultados tão satisfatórios”.

Evidentemente, Halfeld possuía talentos extraordinários, autoconfiança, conhecimento técnico, juízo, previsão e determinação, mas muitos dos seus compatriotas também os tinham, pois sem exagero e sem inveja registraram que o compasso e o pincel sozinhos “não fariam a mesma mágica de planejar, pensar e executar obras de vulto”. Prestigiaram nele a diversidade de experiência, a sua cultura refletiva, a sua intuição genial que guiaram a moldagem do futuro pessoal e coletivo. Surgiu primeiro, a Estrada de Paraibuna, depois a Vila de Santo Antonio de Paraibuna e hoje a importante metrópole Juiz de Fora.

Em seu segundo casamento, com Cândida Maria Carlota, herdeira de valiosas e extensas terras, Henrique alcançou seu “ardente desejo de criar uma cidade”. O sonho tornou-se realidade, embora fosse obtida por muitas lutas e adversidades. Fundou a cidade de Juiz de Fora em 1840 e conquistou a Ordem de Cavaleiro e Comendador da “Imperial Ordem de Rosa”.

Tinha quinze filhos: Pedro Maria, Ana Antônia, Fernando Mariano Halfeld, Josefina Antônia, Fernando Feliciano Halfeld, Guilherme Justino, Antônio Amalio, Dorothéa Ana, Carlos Antônio, Bernardo Mariano, Emília Antônia, Luiz Joaquim, Henrique Guilherme Fernando, José Antônio e Júlio Augusto.

Seu terceiro casamento, em 1867, com Maria Luisa Pinto Coelho da Cunha, durou 6 anos. Morreu na idade de 77 anos. Desde então, seu nome foi alvo de homenagens por parte dos membros da Câmara Municipal da sua cidade e dos escritores e poetas.

Depois de passar pela leitura da vida do patrono desta cadeira perguntaremos, onde encontrar as raízes da síntese da história nacional, senão na herança dos antepassados? Sem choques nem atritos é a ciência dos heróis que influenciaram a cultura mineira. O pioneirismo e a responsabilidade exclusiva de todos os processos de planejamento e administração representavam uma novidade real na época em que viveram.

Embora ele tivesse atraído para si a atenção dos cidadãos, só agora é que nossos olhos estão descobrindo o brilho de suas atitudes em vencer as dificuldades e colocando seu caráter em destaque.

É muito difícil olhar efetivamente para a obra de uma pessoa bem dotada em vários aspectos: planejador, administrador, economista, critico e possuidor de um talento de observação que avalia os projetos de uma forma indubitavelmente séria. É uma perspectiva histórica. Olhar, visitar agora a cidade de Juiz de Fora, tem que se reconhecer, foi pelo seu verdadeiro talento e sua capacidade de fundador que realizou uma obra de tão grande vulto.

Por trás das suas anotações publicadas sente-se a paixão de um construtor que iniciou o nosso mundo visível e o intelectual de ações decisivas, portanto, a nossa homenagem a esse vulto significativo.