BÁRBARA HELIODORA GUILHIERMINA DA SILVEIRA

PATRONO DA CADEIRA NÚMERO 16

Por Cely Vilhena

Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira (que mesmo depois de casada, manteve seu nome e sobrenome de solteira), nasceu em 3 de dezembro de 1759, em São João del Rei, Minas Gerais.

Era filha do Senhor José da Silveira e Souza, português de Tomar e de Dona Maria Josefa Bueno da Cunha, neta do bandeirante Amador Bueno “o Anhanguera”, cognominado “O Aclamado”, fundador de uma grande dinastia paulista.

Bela, prendada, teria tido formação primorosa, religiosa, social e cultural, como soe ser dada às filhas de famílias conceituadas e disto, Bárbara Heliodora, tinha orgulho e consciência. Cultuava as letras e os autores clássicos, dedicava-se à poesia e à música, e frequentava os salões da aristocracia da época.

Enamorou-se do Ouvidor da Comarca do Rio das Mortes, com sede em São João del Rei, Doutor Inácio José de Alvarenga Peixoto, e dessa união nasceu-lhes a primeira filha Maria Efigênia, em 1779, linda criança que os pais chamavam de “princesa do Brasil”. Casaram-se em 1781 e tiveram mais três filhos: em 1787, José Eleutério; João Damasceno, depois mudado (por influência maçônica) para João Evangelista, em 1788, e Tristão, em 1789.

Seu esposo, Alvarenga Peixoto, nasceu no Rio de Janeiro em 1743, estudou em colégio religioso, doutorou-se em leis por Coimbra e após servir em Sintra (Portugal) foi nomeado ouvidor da Comarca do Rio das Mortes, com sede em São João del Rei. Ilustrado, competente, ávido de bens e de terras, de cultura e lavras de ouro, comprou fazendas nos entornos do Descoberto do Rio Verde e do Rio Sapucaí. Possuía lavras de ouro e muitos escravos.

Recém-vindo da Europa, com luzes de um novo mundo a sobrepor-se ao jugo das cortes pelos ideais da liberdade, encontra em terras de Minas Gerais burburinhos e queixas contra os desmandos dos reinóis e as evidências da derrama do quinto do ouro a ser promulgada pela corte, o que determinou os motivos da Conjuração Mineira e da qual também se fez participante, movimento que uniu religiosos, doutos e letrados, senhores de terras, lavras de ouro e escravos, tendo o alferes Joaquim José da Silva Xavier – o Tiradentes – como o propagador da iminente insurreição mineira.

Com a delação de Silvério dos Reis, instala-se a devassa. E a prisão dos inconfidentes, dentre eles Alvarenga Peixoto, levados para a prisão da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro.

O poeta Alvarenga Peixoto dedicou a sua esposa várias poesias. A saber:

Bárbara Bela
do Norte estrela
que o meu destino
sabes guiar,
de ti ausente,
triste, somente
as horas passo
a suspirar.
Isto é castigo
que o amor me dá.

Após três anos de prisão, em 18 de abril de 1792, os prisioneiros ouviram a sentença que os condenava: só Tiradentes seria enforcado e seus membros esquartejados e sua cabeça posta no alto, empalada em Vila Rica. Trocada a pena de morte para exílio em África, Alvarenga Peixoto é enviado a Angola. Bárbara Heliodora pediu à corte que a deixasse acompanhá-lo, o que lhe foi negado. Mais tarde ele faleceu em Ambaca, em 1792, com 49 anos.

Bárbara Heliodora participara de algumas reuniões onde a situação era contada à meia voz, deu prova de sua intemerata consciência e é considerada como heroína da Inconfidência Mineira, por sua coragem em não deixar que seu esposo vacilasse dizendo-lhe a célebre citação emblemática: Trair Jamais. “Embora não importa, seja infinito o sofrimento cruel”.

Após o degredo de seu marido, Bárbara lutou para receber a meação de seus bens, pois se viu pobre e sem recursos para educar seus filhos. Como prova de sua instrução e capacidade intelectual escreveu cartas para seu compadre e amigo de Alvarenga Peixoto, senhor João Rodrigues de Macedo (cidadão respeitado em toda a capitania e contratador dos direitos reais) solicitando-lhe ajuda para receber a meação de seus bens, o que comprova sua capacidade de administrá-los, propondo-lhe que fosse seu sócio e assim conseguiu manter-se e a seus filhos.

Ressalte-se a grande dor da perda de sua primogênita Maria Efigênia em acidente, evidenciando sua grande prosternação.

Após a devassa, Bárbara Heliodora Continuou morando em São Gonçalo do Sapucaí, onde faleceu aos 24 de maio de 1819, com 60 anos, vítima de Tuberculose. Foi enterrada com o hábito da Ordem Terceira do Carmo da qual fazia parte. Nove padres participaram de suas exéquias.

Embora dois de seus filhos tenham sido internados por problemas mentais, Bárbara Heliodora, como muitos querem, não era louca e sim passou por depressão profunda, tendo seu filho Tristão também falecido com Tuberculose.

Os biógrafos de Bárbara Heliodora se empenharam durante décadas nos estudos sobre a Inconfidência Mineira em pesquisar sua origem e dados que ilustrassem a vida da que, inevitavelmente, sofreu, na pele a na alma, a desventura de participar não apenas como esposa do Inconfidente Alvarenga Peixoto, ex-ouvidor da Comarca do Rio das Mortes e Coronel, mas, como cidadã brasileira e heroína da tragédia que se abateu sobre Minas Gerais.

Mas, entre seus biógrafos, há sérias divergências, a saber:

1 - Lugar de nascimento.
Do ilustre historiador José Crux Rodrigues Vieira em seu alentado estudo sobre a Inconfidência Mineira em três volumes, intitulado Tiradentes a Inconfidência diante da História, diz que o Doutor José da Silveira e Souza estivera em São João del Rei por volta de 1750, e mudou-se para Goiás, onde se casou com Dona Maria Josefa Bueno da Cunha, retomando a São João del Rei em 1763, trazendo suas primeiras filhas - entre elas a primogênita Bárbara Heliodora. (vide 2° volume, 1°tomo, capítulo 19, fls 66 a 74). Versão esta que mencionei em meu livro “Bárbara Eleodora – Romance” com o qual ilustrei minha posse neste Egrégio IHGMG, em 13 de março de 1999.

No entanto, o Suplemento Literário do “Minas Gerais”, em edição especial a São João del Rei, traz sobre o título – 1819-1969 – Bárbara Heliodora, nas comemorações dos 150 anos de seu morte – organizado por Rui Mourão e Laís Corrêa de Araújo – a versão do biógrafo João Lúcio Brandão, que relata seu nascimento em 3 de dezembro de 1759, em São João del Rei: confirmação ratificada por ter sido encontrada sua certidão de nascimento ou batismo (embora não a tenham exibido).

2 - Outra contestação é a respeito de seu nome – o historiador Martins de Oliveira assevera que não há referência histórica de que o H permaneça em seu nome e sim Bárbara Eliodora, pois assim era sua assinatura (comprovada por carta inserida no referido Suplemento) e que as entidades históricas devem retificá-lo sem demora, com inclusão do i e sem o e (de Eleodora), como recomenda Augusto Viegas. Entretanto, o nome de Bárbara Eleodora é asseverado por Monsenhor Lefort, associado do IHGMG em Campanha – em seu livro “Monografia Histórica da cidade de Campanha”, pois ela assim o assinava (motivo do nome de meu livro “Romance de Bárbara Eleodora”).

3 – Concordo com o escritor João Lúcio Brandão, quanto à autoria do poema “Conselhos a meus filhos” ser de Bárbara Heliodora, por sua elaboração e cuidado. Vejamos: (Terceiro Verso)

“Aplicai ao conversar
Todos os cinco sentidos
Que as paredes tem ouvidos

E também podem falar:
Há bichinhos escondidos
Que só vivem a escutar”

Bárbara Heliodora foi exaltada como heroína da Inconfidência Mineira por historiadores e poetas, estudiosos e membros da literatura e cientistas polígrafos, não só por sua beleza e cultura como por sua personalidade marcante, que a distinguia dos padrões femininos de seu tempo, e a consciência de sua fidalguia ao honrar sua estirpe e sua pátria – o Brasil. Assim ela é descrita no Romanceiro da Inconfidência de Cecília Meireles, na peça teatral Liberdade embora tarde de Domingos Carvalho da Silva, pelos historiadores João Brandão, Aureliano Leite, Mário da Silva, Henriqueta Lisboa e Bueno Rivera (em versos lindos) e História de uma flor – Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira de Nívia Nohmi.

Com o traslado dos restos mortais dos inconfidentes nas lápides do Museu da Inconfidência, no Panteão da História, duas personalidades femininas ladeiam os inconfidentes: Marília de Dirceu (a noiva de Tomaz Antônio Gonzaga) e Bárbara Heliodora (a esposa de Alvarenga Peixoto).

E assim fecha-se o trágico cenário de uma luta inglória e abre-se para a Pátria Brasileira a chama da liberdade e do civismo de uma Pátria inteira à luz da História.